Com a luz do Natal nos é manifestada a cada um de nós a infinita bondade
de Deus. Em
Jesus Cristo o Pai celestial inaugurou uma nova relação conosco; nos fez
“filhos em seu Filho”. Não somos só criaturas; somos filhos. Deste modo nos
atrai a si no momento de sua encarnação, ao fazer-se um de nós.
Por
conseguinte, pertencemos
verdadeiramente à família que tem
Deus como Pai, porque Jesus, o Filho
unigênito, veio colocar sua morada em meio a nós, a morada de sua carne, para
congregar todas as pessoas em uma única
família, a família de Deus, que pertence realmente ao Ser divino: todos estamos
unidos em um só povo, em uma só família.
Veio para nos
revelar a verdadeira face do Pai. E se agora nós usamos a palavra Deus, já não
se trata de uma realidade conhecida somente de longe. Nós conhecemos a face de
Deus: é a face do Filho, que veio para fazer mais próxima a nós a terra, as
realidades celestes. São João explica:
“Nisto consiste o amor: não em que nós tenhamos amado a Deus, mas no fato de Ele nos ter amado
primeiro” – 1Jo 4, 10.
No Natal ressoa
no mundo inteiro o anúncio simples e desconcertante: “Deus nos ama”. “Nós
amamos, diz S. João, porque Ele nos amou primeiro” 1Jo 4,19. Este mistério já
está colocado em nossas mãos porque, ao
experimentar o amor divino, vivemos orientados às realidades do céu. E o exercício destes dias consiste
também em viver realmente orientados a Deus , buscando antes de tudo o Reino e
a sua justiça, com a certeza de que o resto, todo o resto, nos será dado como
acréscimo – cf Mt 6, 33. O clima espiritual do tempo natalino nos ajuda a
crescer nesta consciência.
Contudo, a
alegria do Natal nos faz esquecer o mistério do mal- mysterium iniquitatis-, o poder
das trevas, que tenta obscurecer o esplendor da luz divina; e, infelizmente,
experimentamos cada dia este poder das trevas. No prólogo do seu Evangelho, que
proclamamos várias vezes nestes dias, o evangelista João escreve: “A luz brilha
nas trevas, e as trevas não a acolheram” – Jo 1, 5.
É o drama da
rejeição a Cristo que, como no passado, também
hoje se manifesta e se expressa, infelizmente, de muitas formas
diversas.
Talvez na época contemporânea estejam também mais disfarçadas e
perigosas as formas de rejeição de Deus: vão desde a rejeição em si até a
indiferença, desde o ateísmo cientificista até a apresentação de um Jesus que
dizem moderno e pós-moderno. Um Jesus homem, reduzido de modo diverso a um
simples homem de seu tempo, privado de
sua divindade; ou um Jesus tão idealizado que parece às vezes personagem de uma
fábula.
Mas Jesus, o
verdadeiro Jesus da história ,é verdadeiro Deus e verdadeiro homem, e não se
cansa de propor seu Evangelho a todos, sabendo que é “sinal de contradições” –
cf Lc 2, 34-35, como profetizou o velho Simeão.
Na verdade, só o Menino que jaz
no presépio possui o verdadeiro segredo da vida. Por isso pede que o acolhamos,
que demos espaço em nós, em nossos corações, em nossas casas, em nossas cidades
e em nossas sociedades.
Na mente e no
coração ressoam as palavras do prólogo de São João: “A todos os que o acolheram
lhes deu poder de tornar-se filhos de Deus” – Jo 1, 12. Tratemos de nos contar entre os que o
acolhem. Diante dele ninguém pode ficar
indiferente. Também nós, queridos amigos, devemos tomar posição continuamente.
Qual será,
portanto, nossa resposta? Com que atitude o acolhemos? Vem em nossa ajuda a
simplicidade dos pastores e a busca dos magos que, através da estrela,
perscrutam os sinais de Deus; servem-nos de exemplo a docilidade de Maria e a
sábia prudência de José.
Os mais de dois mil anos de história cristã estão cheios
de exemplos de homens e mulheres, de jovens e crianças e idosos que
acreditaram no mistério do Natal e abriram
seus braços ao Emanuel, convertendo-se com sua vida em sinais de luz e
esperança.
Que Maria nos
ajude a abrir nosso coração ao Emanuel, que assumiu nossa pobre e frágil carne
para compartilhar conosco o fatigoso caminho da vida terrena. Contudo, na
companhia de Jesus este fatigante caminho se transforma em um caminho de
alegria. Percorremos juntamente com Jesus, caminhemos com Ele; assim o ano novo
será um ano feliz e bom.”
Cf.: Mistagogias
de Bento XVI sobre a Igreja, tradução frei Boaventura Kloppenburg OFM, Ed.
Vozes, 2007, pp 182-185.