Mais três, e encerraremos o ano litúrgico, com a Solenidade de
Cristo-Rei. O
tempo passa, a vida passa, a história passa… Elevemos o olhar e o coração para
Aquele que não passa, Aquele que é o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim da
nossa existência, o Cristo, nosso Deus!
No passado
Domingo, o Senhor Jesus ordenava: “Dai a Deus o que é de Deus!” De
Deus é tudo, ainda que tudo pareça nosso: “Tudo pertence a vós: Paulo,
Apolo, Cefas, o mundo, a vida, a morte, as coisas presentes e as futuras.Tudo é
vosso; mas vós sois de Cristo e Cristo é de Deus” (1Cor 3,21-23).
Esta é, precisamente, a dificuldade, a miopia ou, mais ainda, a cegueira, o triste pecado do mundo atual: não perceber Deus, não enxergar com a razão, com o afeto, com o coração que Deus é o Tudo, o Substrato, o Sentido da nossa existência.
Sem ele, nada tem sentido perene, nada tem valor duradouro, nada
tem valor absoluto… nem a vida humana, que somente pode ser respeitada de modo
absoluto quando é compreendida como imagem de Deus. Pois bem, a
Palavra deste Domingo prolonga a de oito dias atrás. “Mestre,
qual é o maior mandamento da Lei?”, da Lei de Moisés –
perguntam ao Senhor para novamente tentar apanhá-lo em armadilha. Qual
o preceito que, sendo observado, resume a observância de toda Lei? Jesus
responde prontamente: “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de
toda a tua alma, e de todo o teu entendimento!”
Como bom judeu, o Senhor Jesus nada mais faz que retomar o preceito do Antigo Testamento. Amar a Deus! Amá-lo significa fazer dele o tudo da nossa existência, significa viver a vida aberta para ele, buscando sinceramente a sua santa vontade.
Amá-lo é não
conceber a vida como algo que é meu em sentido absoluto, mas um dom que recebi
de Deus, que em diante de Deus devo viver e a Deus devo, um dia, devolver com
frutos. Amá-lo é não viver na minha vontade, mas buscando a sua santa vontade,
mesmo que esta não seja o que eu esperaria ou desejaria… Amá-lo é sair de mim
para encontrar-me nele!
Mas, para que
este amor a Deus não seja algo abstrato, teórico, meramente feito de palavras
ou sentimentos superficiais, o Senhor Jesus nos aponta uma medida concreta
desse amor.
Seguindo ainda a tradição judaica do Antigo Testamento, ele liga,
condiciona o amor a Deus ao amor aos outros, aos próximos, àqueles que a
providência divina coloca no nosso caminho: “Amarás ao teu próximo como a
ti mesmo”.
Toda a Lei e os profetas dependem desses dois mandamentos”. Eis, portanto: a medida da verdade do amor a Deus é o amor, a dedicação para com os outros; e não os outros teoricamente, mas os próximos: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo!” Notemos que aqui Jesus não ensina nada de novo.
Este preceito já valia para um bom judeu. Jesus está respondendo a um fariseu,
um escriba judeu. Basta recordar como a primeira leitura de hoje, tirada da Torah,
da Lei de Moisés, já ligava os dois amores, a Deus e ao próximo. O Senhor, já
no Antigo Testamento, deixava claro que estará sempre do lado do nosso próximo,
sobretudo se ele for débil e necessitado:
“Se clamar por mim, eu o ouvirei, porque sou misericordioso.” Estejamos, portanto, atentos: o amor concreto para com o nosso próximo é a medida do nosso amor a Deus!
O Evangelho
– como todo o Novo Testamento e a reta e sadia Tradição da Igreja – desconhece
uma relação com Deus baseada numa fé sem obras que nasçam do amor. Basta
recordar o belíssimo hino ao amor, da Primeira Carta aos Coríntios: “Ainda
que eu tivesse toda a fé, a ponto de transportar montanhas, se não tivesse a
caridade, eu nada seria” (13,2). Que ninguém se iluda com um vazio
discurso sobre uma fé vã sem as obras que dela nascem e a revelam!
A fé sem amor a Deus e ao próximo, aquela fé que gosta de dizer “estou salvo” de se compraz em decretar a condenação dos outros é uma fé inútil, vazia, falsa e morta!
Caríssimos, se o
Senhor Jesus respondeu ao escriba fariseu, dizendo que ele deveria amar a Deus
e ao próximo como a si mesmo, a nós, seus discípulos, a nós, cristãos, ele
aponta um ideal muito mais alto!
Ouso afirmar que não basta, de modo algum para
um cristão, amar os outros como a si mesmo! Recordai-vos todos que, na véspera
de sua paixão santíssima, quando sentou-se à Mesa santa conosco, para dar-se a
nós na Eucaristia, como maior dom de amor, o Senhor nosso e Deus nosso, Jesus
Cristo, deu-nos, então, o mandamento pleno, completo: “Amai-vos como eu
vos amei!” (Jo 13,34); “Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, também vós
o façais” (Jo 13,15).
Agora, às vésperas da cruz, agora, à Mesa da
Eucaristia, agora, lavando-nos os pés, dando-se totalmente a nós, Jesus poderia
ser compreendido! Ele é o amor verdadeiro, ele é a medida e o modelo do
amor: “Não há maior prova de amor que dar a vida!” (Jo 15,13) Amai-vos
como eu vos amei!
Eis, caríssimos,
como é grande a tarefa que o Senhor nos confia! Quem poderá realizá-la? Onde
poderemos conseguir um amor assim? Eu vos digo: contemplando Jesus na oração,
escutando Jesus na Escritura, comungando com Jesus na Eucaristia, procurando
Jesus nos irmãos!
É assim que teremos os mesmos sentimentos do Cristo Jesus
(cf. Fl 2,5) e viveremos a vida no amor total que ele, nosso Senhor, teve para
com Deus, o Pai e para com os próximos. Fora disso, toda conversa sobre amor
não passa de teoria, de ideologia que de cristã tem pouco ou nada. Que o Senhor
nos conceda, então, por esta Eucaristia, o dom do verdadeiro amor. Amém.
D. Henrique
Soares da Costa
presbiteros.com.br
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Paróquia Santa Edwiges em Brás de Pina
Pároco Pe Givanildo Luiz Andrade
Imagens Daniel Verdial
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